Música brasileira para violino e piano de Liduíno Pitombeira

Por Sam Cavalcanti

 

João Pessoa,

aos dezessete de fevereiro de dois mil e vinte e um

Imagem incorporada

Imagem cedida por Samuel Cavalcanti

O álbum pela Centaur Records com o ciclo das cinco sonatas para violino e piano do compositor brasileiro Liduíno Pitombeira é um emblema de arte contemporânea latino-americana. Gravado pelo duo Alexander-Soares, o álbum traz referências da cultura brasileira, notadamente, das tradições da região nordeste que, em muitos momentos, permeia a criatividade do compositor nascido no estado do Ceará. Através deste gênero é possível traçar um perfil estilístico, donde se vê desde o opus 9 ao opus 137 um amadurecimento e apropriação d’um discurso cada vez mais eloquente. Dezesseis anos se distanciam entre a primeira Sonata, composta em 1992 e a última (2008), dedicada ao referido duo que executa com competência e louvável empenho à música brasileira. As duas primeiras sonatas em muito se assemelham: desde uma nostalgia melódica ao levare rítmico que pulsa nos terceiros movimentos com os sotaques do nordeste brasileiro. Enquanto na primeira Sonata é clara uma sombra villa-lobiana, sobretudo na concepção do mélos que tende a retornar a uma nota central, muito comum nas elaborações melódicas de Villa-Lobos; já na segunda Sonata é a influência de Camargo Guarnieri que se ouve em primeiro plano e que fica evidente no gesto de finalização do primeiro movimento. Quanto à engenharia de gravação é bom frisar que em geral, peca-se na mecanização das articulações que são, ao longo de todo o álbum, quase que linearizadas, diminuindo o fluxo expressivo e de dinâmica. As três últimas sonatas alcançam um grau maior de maturidade e de proximidade estilística, conquanto percebe-se que Liduíno mantém deliberadamente a tradição estrutural em todo o ciclo: três movimentos, sendo o primeiro o mais explorado formalmente, o segundo, reflexivo, e o terceiro, desafiador ritmicamente. Fica-nos deste álbum, um trovador contemporâneo, as rezas e aboios, os lamentos e danças de um compositor-repentista que embute na forma-sonata a tradição de sua terra, seguindo essa tradição deixada pelos grandes mestres Villa-Lobos, Guarnieri e José Siqueira, sem perder também de vista a sombra de seu mestre argentino-paraibano José Alberto Kaplan que paira aqui e ali, sombreando alla Brasil o tom da música de Pitombeira: competentemente escritas suas sonatas; vale a pena ouvi-lo!

 

A composição é, para mim, uma necessidade, até mesmo orgânica" | Paginas-Azuis | OPOVO+

Liduíno Pitombeira; Imagem: Internet

Adendo para a MEMUS:

Link da publicação originária

Canal no Youtube do duo Alexander-Soares

Infelizmente, não há gravações aduviovisuais ainda nesse canal que é muito pouco acessado. E, de Liduíno, só se encontram as obras (ou trechos) o terceiro Cordel; e o terceiro movimento da terceira Sonata, a que o compositor chamou de “Rotina”, numa forma na qual o grupo temático mais pulsante emula lembranças das rotinas rítmicas do maracatu e seus derivados contemporâneos.

Também trago ao compartilhamento mais amplo a divulgação do trabalho acadêmico em nível de doutoramento da violinista conterrânea de Liduíno, Elaine Bastos que, com o pianista Guilherme Coelho Godoi, tocaram e dispuseram vídeos em agosto de 2016, em seu canal no Youtube, da íntegra da terceira Sonata: Frevo e Baião; Quarta-feira; e Rotina. A obra perfaz uma espécie de tríptico alegórico dos festejos carnavalescos nordestinos no primeiro movimento, o nostálgico e ressacado pós-carnaval com as cinzas da quarta-feira, e o retorno rotineiro aos trabalhos.