Um simples compositor

 

 

Escrito em João Pessoa,  aos 21 de Janeiro de 2013

Publicado em oito de Fevereiro de 2013

Texto atualizado para a Memus aos sete de setembro de dois mil e vinte e um

 

 

Projeto Sesc Partituras homenageia o maestro Tom K — A União - Jornal, Editora e Gráfica

Tom k; Imagem: Reprodução

Antônio Carlos Batista Pinto Coelho é um homem simples, à moda antiga. Gentil, o maestro Tom K, como é conhecido, faz música como quem cumprimenta atenciosamente a entes queridos e desconhecidos, mantendo-se sempre cortês e tranquilo em seu discurso. De fato, o Tom K maduro de hoje, professor universitário aposentado, regente de coro experimentado – cuja lembrança me leva à mais tocante interpretação de Bruckner em terras nordestinas, quando de sua liderança do coro Villa-Lobos, ligado à Universidade Federal da Paraíba – fala devagar, com uma inflexão e timbre bastante peculiares e se mostra sempre parcimonioso em suas ponderações. O álbum ‘Tom K por alunos’ revela facetas de uma alma cancioneira, nostálgica e calma. São quatorze peças “de gaveta”, algumas das quais já mereciam gravação e interpretações correntes há muito. Desde o título vê-se a relação saudável que mantém com seus pupilos e a preocupação didáctica ao compor: suas peças revestem-se de uma arte quase fílmica, remetem sempre ao populário brasileiro, seja do folclore como nas Variações sobre ‘ó Mana deixa eu ir’ (melodia que me é cara e que também tenho usado em obras), seja nos sambas de esquina, sambas quase-choros, ou choros-serestas e tangueiras brasileiras ao violão ou ao saxofone, releituras estilísticas. Um filme sem imagens prontas, este álbum nos reporta aos interiores brasileiros, à brasileirice brejeira, silvícola e citadina. Longe da simploriedade, e íntimo da simplicidade, Tom K, nos mostra uma coletânea honesta de peças que denotam sua humildade ao compor e seu crédito no que lhe é mais caro: uma música atemporal de lembranças dos tempos que não voltam mais… Seus alunos conseguiram captar cada mensagem do mestre que não somente interpreta bem a música coral de Bruckner, mas também se assemelha em personalidade ao gênio austríaco: pela espontaneidade e despretensão, pela hombridade de quem além de professor, regente de coro, é também um simples compositor a preludiar, quase que monasticamente, simples emoções.

Um de seus muitos ex-alunos, o jovem regente paraibano Daniel Berg foi audaz ao levar à terra de Shostakovich e Dostoiévski peças brasileiras para que cantores russos as desfrutassem. Em Gatchina, cidade da província (oblasti) de Lenningrado, ao noroeste russo, participou da V Escola de Verão para Regentes de Coro e Compositores da Rússia. Lá, neste evento promovido pela Associação de Coros-Jovens do Noroeste Russo, e com a promoção do Centro Educacional de São Petersburgo e o Comitê Cultural de Leningrado, Daniel ensaiou canções folclóricas, a canção Canta, canta mais, de Vinícius de Moraes e Tom Jobim, e ainda, uma ciranda de Tom K. Na ciranda, Daniel organizou um movimento de congraçamento com um grupo em cerca de quarenta vozes, que cantaram essa nostálgica canção dançante,  cuja melodia cativou aos russos participantes do evento, de forma bastante efetiva. Vê-se no vídeo os sorrisos e, ao final, os aplausos calorosos que bem sabemos a boa música brasileira sempre poderá causar em quaisquer públicos e sobretudo nos que a fazem. E Daniel envolve a todos os cantores fazendo-os cirandar, movimento que os enche de muita alegria.  

O próprio Tom K, arranjou e gravou em 1998 o Toré dos Caboclos e dos Mestres. O professor e conterrâneo Vladimir Silva, que tem compilado esse repertório coral regional, sobre esta peça peça, esclarece: “é uma composição para coro a cappella, de Antônio Carlos Batista Pinto Coelho (Tom K), escrita em 1996. A obra é inspirada num ritual de culto da jurema, realizado na cidade de Alhandra-PB […] foi gravado em setembro de 1998 pelo Coro de Câmara Villa-Lobos, sob a direção do próprio compositor, tendo sido digitalizado recentemente para a produção desta animação. Eventuais falhas no áudio são oriundas da gravação original.”

Outra obra simples que segue a ilustrar a persona do compositor, é Cantigas & Cantares II, para quarteto de cordas; obra que remete à mocidade do compositor, citando melodias do populário infantil. Essa gravação em particular, posso falar porque estive tendo obra também tocada nessa noite, tive essa satisfação de ter dividido palco com Tom K e comemorar o primeiro decênio de existência do Laboratório de Composição Musical, ligado à Universidade Federal da Paraíba (COMPOMUS), do qual nós somos membros e colegas.

Há de ter mais vídeos com músicas de Tom K pela Rede Mundial de Computadores; e esperemos que estas peças sejam mais e mais conhecidas. A música brasileira é timbrada na pena dele.

 

Sam Cavalcanti

Mestre em Música

Publicação original
Até outubro!